5 de jan. de 2010

Eu durmo no abismo de uma mulher

Para construir as sombras do amor, é preciso se iludir. Meu corpo, cada vez mais magro, me aparenta o mais forte dos homens. Me tente! Me provoque ou desafie, eu te cedo todos os meus domesticados demônios. Mas se te mostro minha face no indiferente afetamento da humildade tu perderá o jogo sozinho.

Acho bonito pensar que os corpos quando abraçados em forma fetal no sofá batem o mesmo ritmo cardíaco. Fomos rasgados. Mas e daí? Quando verei tu parar de chorar e me abraçar de orgãos unidos? Eu sinto tua falta na ferida viva do meu coração. Lembro bem dos rituais pagãos ao descobrir o corpo: cavaleiros mascarados em círculo e nós dois trepando no meio do altar.

Mas aquilo era nosso intento de ser. Então por favor, não me tenha fetiche ao ver o mundo transar. Nós estamos em núpcias o tempo inteiro. Cada nossa respiração bulina o vento e a planta numa orgia nupcial de amor. Eu, que me sinto agora adoecido de amor, não posso transformar o tempo, posto que o tempo me abandona. Me perdoe tempo, pois sou mesmo eu que morro neste instante.

Faça valer homem cansado! Faça valer seu merda! Sou homem e quero que tu saiba mais do que sou terra: Cala tua boca diante desta mulher. Não vês que só de te permitir penetrar a alma de seu útero já deves ter a existência agradecida? Nosso corpo bruto feito em mil traços é feito para permanecer. Enquanto a mulher flutua, dobra e tece a teia do mundo.

Mesmo minha espada não te sangraria mais do que o abismo desta mulher. Mas seja grato pelo sangue desta ferida, porque de minha espada tu terá mesmo só a cabeça cortada. Renuncia tua masculinidade viril e deixa que teu sentimento de gratidão submeta-se à mulher. Não será senhor dela, sem antes aprender a ser seu criado. Ela quer teu gozo assim como nós queremos, se tivermos sorte, estar ao lado dela..

..em nossa morte.

Um comentário:

  1. Uma Mulher no Meio do Mar

    "... não sentes que é preciso que ela vá,
    vá dar morada às algas que lhe cobrirão amorosamente o corpo
    Para fugir de ti que a cobrias apenas com a ardência imutável do teu desejo?..."

    Vinícius de Moraes

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